O Tribunal Penal Internacional abandonou o Microsoft Office e está adotando o pacote de aplicativos de escritório europeu openDesk, criado como alternativa ao software americano. A decisão surge em resposta às crescentes preocupações na Europa sobre a dependência de agências governamentais em relação à tecnologia americana e sua potencial influência política.
O serviço de imprensa do tribunal confirmou o processo de transição, mas a organização não divulgou detalhes nem cronogramas de implementação. O OpenDesk está sendo desenvolvido pelo Centro para a Soberania Digital na Alemanha (ZenDiS) em nome do Ministério Federal do Interior. Este pacote combina um editor de texto, um sistema de colaboração e ferramentas de comunicação, e seu código-fonte é aberto — ou seja, não é controlado por uma empresa privada.
Para as organizações internacionais, este passo é simbólico. Nos últimos anos, o sentimento a favor da independência digital tem crescido na Europa. Isso foi impulsionado não apenas pelas grandes interrupções dos serviços de nuvem da AWS e do Microsoft Azure, mas também pelas disposições da Lei de Nuvem dos EUA, que permite às autoridades americanas solicitar acesso a dados armazenados por empresas americanas, mesmo que os servidores armazenados localizados no exterior. Isso, na prática, priva as instituições europeias de garantias de privacidade.
A situação foi agravada pelas recentes políticas. Em fevereiro, o ex-presidente dos EUA, Donald Trump, assinar uma ordem executiva sancionando funcionários do Tribunal Penal Internacional (TPI) devido aos mandados de prisão contra o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, por acusações de crimes de guerra. Na sequência, o procurador-chefe do tribunal, Karim Khan, perdeu temporariamente o acesso à sua conta da Microsoft, causando controvérsia. O presidente da Microsoft, Brad Smith, afirmou posteriormente que a empresa não havia bloqueado o acesso nem suspenso os serviços ao TPI, mas o próprio fato aumentou a desconfiança em relação aos fornecedores americanos.
Esta não é a primeira vez que a Europa adota soluções de código aberto. Munique tentou migrar do Windows para o Linux e o LibreOffice, mas em 2020 retornou aos produtos da Microsoft. Enquanto isso, o estado de Schleswig-Holstein, no norte da Alemanha, concluiu com sucesso um projeto semelhante: neste ano, as autoridades anunciaram uma migração completa de 40.000 estações de trabalho para o Linux e aplicativos de escritório de código aberto. Agora, o Tribunal Penal Internacional está seguindo o exemplo, tornando-se efetivamente a primeira instituição internacional a abandonar oficialmente as soluções de escritório americanas.
A Microsoft, por sua vez, afirmou que valoriza a sua parceria com a ICC e “não vê obstáculos” para a continuidade da cooperação. No entanto, para as organizações europeias, a questão da soberania digital é cada vez mais indo além da tecnologia — está a tornar-se uma questão de independência e segurança de dados.
